Passou na TVI, não sei precisar a data, uma reportagem sobre o final da Guerra Colonial, tendo o seu foco nos milhares que tiveram de abandonar tudo o que tinham para regressar para um país que, para muitos, nem sequer lhes era familiar.
O pós 25 de Abril foi uma época conturbada e repleta de incertezas. Para os que voltaram a Portugal e para os que já cá estavam e foram obrigados a aprender uma nova realidade. Isto de se ter liberdade é muito bonito, mas é muito fácil acabar em anarquia. Sobretudo, quando estamos a falar de uma população que cresceu sem ela e que, sem qualquer preparação ou referência, se vê com ela nas mãos.
Como tal, as pessoas que moravam no Portugal da época não viram com bons olhos o regresso de tanta gente vinda das antigas colónias. O próprio termo "retornado" encerra em si uma conotação negativa, repleta de preconceito para com pessoas, portuguesas como as restantes, que chegavam a Lisboa com tantos hábitos e costumes diferentes. O medo de que lhes viessem roubas os empregos e os privilégios foi o combustível que alimentou esta questão durante muitos anos.
Sou filha e sobrinha de "retornados". E tenho muito orgulho nisso. O meu pai e os irmãos tiveram o privilégio de nascer e crescer em Moçambique. Mais concretamente em
Lourenço Marques, actual Maputo. Como devem imaginar, são mais que muitas as histórias tropicais que pintaram a minha infância.
Histórias essas que só aumentam o meu desejo de conhecer essa terra na companhia do meu pai e com ele conhecer o palco das aventuras e desventuras tamanhas que ele viveu nos anos dourados em que viveu por lá. Sempre que o ouço falar desse lugar, noto a diferença que era viver em África, quando comparamos com o Portugal de Salazar. Claro que também existia censura e coisas que tal. No entanto, a liberdade era bem maior. Por lá, bebia-se coca-cola e guiava-se à direita, influência da proximidade com a África do Sul.
Por muito que tente, não consigo imaginar o que sentiu aquela gente quando, para salvar a vida, deixou tudo para trás, tudo o que tinham e tudo o que conheciam, para se deparar com um Portugal ainda tão atrasado e retrógrado. Sem esquecer a forma pouco simpática como foram recebidos pelos portugueses que cá estavam.
Inegável é a forma como África lhes fica no coração. Por muitos anos que passem, por muitos quilómetros que os separem, falam sempre dessas terras com uma saudade e um brilho nos olhos. Com uma esperança de voltar a ver esses lugares e um medo do que poderão encontrar com esse regresso.
Como filha de moçambicano, não posso deixar de partilhar o meu desagrado pela forma que, sempre que se fala nos meios de comunicação social deste assunto, parece que só de Angola se trata. Como se as pessoas vindas das outras colónias não tivessem nada de importante para acrescentar a esses testemunhos. Penso que seria interessante ouvir e conhecer melhor as outras realidades. O que aconteceu nesses outros países na hora de voltar. Como viviam e o que deixaram para trás.
Será que existirão jornalistas interessados nessas histórias? Espero que sim. Espero vir a ter a oportunidade de ouvir esses testemunhos da descolonização.