Sinopse
A bela Lady Susan Vernon, viúva há pouco tempo, busca um novo e vantajoso matrimónio para si, ao mesmo tempo em que tenta um casamento para a sua filha com um homem que ela detesta. Ela preenche a sua agenda de compromissos com convites para visitas estendidas aos parentes e por uma série de manobras astuciosas, de modo a atingir o seu plano principal.
Lady Susan, escrito entre 1794 e 1805, mas publicado apenas em 1871 por James Edward Austen-Leigh, sobrinho da escritora, é um magnífico romance epistolar, frequentemente provocativo, sobre os costumes e os modos das primeiras décadas do século XIX, em Inglaterra, que tornou-se um dos favoritos dentre os leitores de Jane Austen.
Escandalosamente divertido e artisticamente melodramático, Lady Susan é um romance quase esquecido dentro do magnífico conjunto da obra de Jane Austen, menosprezado pela comparação com os seus seis romances maiores.
Uma vez que poucos romances podem superar ou equivaler-se às obras-primas de Jane Austen, Lady Susan deve ser aceito pelo que realmente é: uma peça encantadora e muito divertida, elaborada por uma jovem escritora que apresenta-nos personagens interessantes e provocantes e que também revela-nos a sua compreensão inicial das maquinações sociais através de uma linguagem muito requintada.
O maior desafio de Jane Austen parece residir nas limitações do formato epistolar onde a narrativa é revelada gradativamente através da perspectiva de uma pessoa e, em seguida, através da reação e resposta do outro, o que não permite a energia do diálogo direto ou a variação de descrições de cena ou arredores. Dadas as suas limitações narrativas ainda é uma joia brilhante, inteligente, intrigantemente mal intencionado.
Opinião
Jane Austen, uma das mais famosas escritoras da literatura inglesa, nasceu em 16 de Dezembro de 1775 e faleceu em 18 de Julho de 1817. A sua obra é amplamente celebrada pela sua perspicácia aguda sobre a sociedade do século XIX, especialmente em relação à condição feminina, às relações sociais e à moralidade da época. Com um estilo que combina ironia, humor e uma crítica subtil, Austen construiu personagens memoráveis e enredos envolventes que exploram os dilemas do amor e do matrimónio. Lady Susan, uma das primeiras obras de Jane Austen, é uma novela epistolar que, embora menos conhecida do que os seus romances mais famosos, revela a maestria da autora para explorar as complexidades das relações humanas e os jogos de inteligência nas interações sociais.
Escrito numa fase inicial da carreira de Jane Austen, este livro apresenta a intrigante figura de Lady Susan Vernon, uma viúva encantadora e manipuladora, que desafia as convenções da época com o seu comportamento audacioso. A minha edição é acompanhada por alguns escritos da juventude da autora, todos inacabados, o que proporciona uma visão valiosa sobre o seu desenvolvimento literário. Publicada postumamente em 1871, foi uma agradável surpresa descobrir uma jovem Jane Austen tão provocadora com esta sua protagonista inusitada. Desde o início, a trama revela a habilidade da viúva para manipular todos ao seu redor, enquanto procura assegurar um futuro confortável para si e para a sua filha, sem que a felicidade desta última seja tida em linha de conta. Com um espírito independente e uma visão muitas vezes considerada escandalosa para a época, Lady Susan desafia as convenções sociais, flertando com os limites da moralidade e da ética.
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Em Lady Susan, Jane Austen apresenta-nos um cenário social tipicamente inglês do final do século XVIII, onde as convenções sociais e as expectativas de género moldam as interações e os relacionamentos familiares. A obra apresenta-nos uma intrigante galeria de personagens que orbitam em torno da astuta e manipuladora Lady Susan Vernon. Frederica, a filha de Susan, é uma clara representação da inocência e da vulnerabilidade, contrastando com os planos ardilosos da sua mãe. Outros personagens interessantes incluem o generoso mas ingénuo Reginald De Courcy, que se vê seduzido pela protagonista e enredado nas suas maquinações, e a sua irmã, Lady Vernon, que também é cunhada de Susan, que se opõe a esta tentativa de caçar um marido, sobretudo quando o alvo é o seu querido irmão e herdeiro da fortuna da família.
"Se me orgulho de alguma coisa é da minha eloquência. Tal como a beleza desperta admiração, ao domínio da palavra segue-se consideração e estima."
Como sempre, a autora explora temas que permanecem relevantes, como amor, poder e manipulação, além de refletir sobre a posição da mulher na sociedade do seu tempo. A protagonista encarna a ambiguidade moral e a astúcia feminina, utilizando a sua inteligência e charme para navegar nas restrições sociais que cercam as mulheres da sua época. O amor, frequentemente visto como um meio de ascensão social, é tratado de forma pragmática, onde a manipulação se torna numa ferramenta nas mãos de Lady Susan para garantir a sua segurança e status. Na obra também se subentende a fragilidade da posição feminina, onde a dependência económica e a falta de autonomia tornam as mulheres vulneráveis às intrigas e às convenções sociais. Deste modo, Jane Austen oferece uma crítica subtil à hipocrisia da sociedade, ao mesmo tempo que revela a complexidade das relações e as estratégias de sobrevivência que as mulheres tinham de adoptar num mundo dominado pelos homens.
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Apesar de ser uma das suas primeiras obras, já se revela a sua maestria no uso do humor e da ironia, características marcantes do seu estilo. As cartas que compõem a narrativa permitem uma visão íntima das motivações e pensamentos de Lady Susan, ao mesmo tempo que criam um contraste cómico entre as suas intenções e a percepção dos outros personagens. O humor subtil, muitas vezes baseado em mal-entendidos e diálogos espirituosos, serve como um veículo para a crítica social, tornando a leitura muito divertida. Com uma abordagem provocadora, levanta questões sobre a hipocrisia das normas sociais que restringem a liberdade das mulheres e a forma como a moralidade é frequentemente moldada por interesses pessoais. Parece-me que a grande questão que fica a pairar é até que ponto a moralidade é um reflexo de valores universais ou meramente uma construção social.
"Apesar de agora se mostrar humilde, não lhe posso perdoar semelhante exemplo de soberba; e não sei se o castigue recusando a sua amizade algum tempo depois da nossa reconciliação, ou casando-me com ele para o atormentar o resto da vida."
A forma epistolar de Lady Susan, e da maioria dos escritos da juventude aqui reunidos, é um dos aspectos mais cativantes da narrativa, proporcionando um dinamismo singular que envolve o leitor duma forma íntima e imediata. Ao apresentar a história através das cartas trocadas entre os personagens, Austen cria uma experiência de leitura mais pessoal, ainda que seja difícil partilhar todos os detalhes que uma narrativa na primeira ou terceira pessoa permitiria. Esta estrutura propicia, assim, um ritmo ágil, onde as trocas epistolares revelam segredos, intrigas e a sagacidade da protagonista, de forma que cada missiva se torna uma nova peça do quebra-cabeça social que compõe a trama. Quanto aos textos da juventude, estes refletem as primeiras tentativas da autora para explorar os temas que tão bem conhecemos nas suas obras mais conhecidas, oferecendo um vislumbre fascinante do desenvolvimento da sua voz literária.
Foi uma delícia descobrir estes trabalhos de início de carreira da autora, que me parecem fundamentais para apreciar a génese do talento de Austen, que, mesmo nos seus primeiros passos, já demonstrava uma habilidade singular para satirizar a sociedade e explorar as complexidades do comportamento humano. Este terá sido o último livro de Jane Austen, no que toca a romances e novelas acabadas, o que não pode deixar de me entristecer, embora as releituras também sirvam para matar as saudades dos nossos autores favoritos. Mas agora quero muito saber a tua opinião! Já conhecias Lady Susan? O que achaste das intrigas da protagonista? Como compararias as primeiras obras de Jane Austen com os seus romances mais conhecidos? Qual o teu livro favorito da autora? Conta-me tudo nos comentários!