#Livros - Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf - Não Digas Nada a Ninguém

Sinopse

Numa clara manhã de primavera, Clarissa Dalloway resolve sair para comprar flores para a festa que acolherá naquela mesma noite, em sua casa. Enquanto passeia pelas ruas de Londres, são recolhidas imagens, sensações e ideias, entrelaçadas com as personagens que habitam o seu mundo - do marido, Richard Dalloway, à filha, Elizabeth, e a Peter Walsh, amigo de juventude acabado de voltar da Índia - e que com ele se cruzam - como Septimus Warren Smith, veterano da Primeira Guerra Mundial assombrado pela doença mental. Romance que revelou em pleno o talento de Virginia Woolf, a sua perspicácia, a sensibilidade transparente e, sobretudo, a arte suprema de descrever os segredos das almas - não os atos mas as sensações que eles despertam - fazem de Mrs. Dalloway uma obra-prima indiscutível da literatura universal.

Opinião

Começo 2023 com um clássico incontornável da grande autora Virginia Woolf. Não me ocorre melhor forma de iniciar as leituras deste novo ano e só pode ser sinal que grandes livros serão lidos nos próximos meses. Outro ponto positivo é que estamos perante o quarto livro lido da grande pilha de livros comprados na última edição da Feira do Livro de Lisboa e isso me deixa muito satisfeita e optimista para ter um balanço positivo quando a nova edição de 2023 começar.

A escrita e estilo de Virginia Woolf deixa-me sempre surpreendida, porque sinto que foge ao convencional, ao que estou habituada a ler. É sempre uma aventura, um desafio que sinto que estou a aceitar quando abro a primeira página. Fico sempre com a certeza que não consegui absorver tudo o que a autora coloca nas suas obras e que numa releitura futura irei encontrar novos aspectos que me escaparam. Há quem diga que esse é uma das características comuns a todos os livros clássicos da literatura e, quanto mais leio as obras desta autora única, maior a certeza da sua posição cativa nesse lugar onde só se encontram os maiores escritores.

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Mrs. Dalloway começa por narrar a saída da protagonista que dá nome ao livro numa manhã e o seu percurso, o que pensa, o que sente, as pessoas com quem se cruza, o que as liga a ela, memórias passadas, encontros que se esperam no futuro. É um grande fluxo de consciência, e que não se limita à Clarissa. Vai alternando com as outras pessoas que com ela se cruzam ou em quem ela pensa por algum motivo. Parece um relato de vidas comuns, banais, algumas até fúteis, mas que escondem grandes sofrimentos, dores internas, medos e arrependimentos. A própria Clarissa, mulher bem de vida, casada e com uma filha, cuja única preocupação parece ser a festa que irá dar nessa noite, esconde em si conflitos interessantes e próprias de mulheres de meia idade, que colocam em causa a vida que levam, as decisões que tomaram na juventude e que as levaram até ali.

"Sentia-se muito jovem; e, ao mesmo tempo, indizivelmente velha. Passava como uma navalha através de tudo; e, ao mesmo tempo, ficava de fora, a olhar. Tinha a perpétua sensação, enquanto olhava os carros, de estar fora, longe e sozinha, no meio do mar; sempre sentira que era muito perigoso viver, por um só dia que fosse."

Depois desse passeio, quando decide que precisa de costurar o seu vestido para a festa que irá dar, recebe uma visita muito importante para percebermos melhor os dilemas desta mulher. Trata-se do amigo de longa data, Peter, que foi também muito apaixonado por Clarissa e com quem a própria tem uma relação íntima, próxima, apesar da distância física e temporal. Fica claro para nós, leitores, ao longo desse encontro, o quanto se conhecem, o quanto parecem precisar da aprovação do outro. As decisões e a própria vida afastaram estes dois, mas existe um passado que vive presente nas suas memórias, para onde viajam com frequência, e revisitam os momentos importantes e questionam as decisões tomadas.

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São muitas as personagens, do passado e do presente, que povoam esta história, mas tenho de destacar o Septimus, um homem claramente traumatizado pela Primeira Guerra Mundial. Entramos na sua mente, perturbada, transtornada, sem conseguir sentir coisa nenhuma; e na da sua esposa, jovem desiludida e desesperada, que veio de Itália para a fria Londres por amor a este homem, que não reconhece e que tenta ajudar a todo o custo. Quer recuperar o seu marido, a vida que devia ser a sua enquanto recém-casada, e que se encontra tão distante do que tinha imaginado. Por seu lado, o marido parece que nunca foi quem a sua noiva imaginou, que mesmo quando casou, procurava uma fuga, uma tábua de salvação para a sua falta de sentimentos.

"Como transformariam o mundo, se o tivesse desposado! Ao passo que a realidade era outra; o envelhecimento; a mediocridade; depois, obrigava-se, com a sua indomável vitalidade, a não mais pensar naquilo, pois havia nela uma corrente de vida cuja força, resistência e poder de derrubar obstáculos, e transportá-la, em triunfo, acima de tudo, era sem dúvida inigualável."

É uma leitura fascinante, envolvente, perturbadora, por vezes, e que nos persegue se pausarmos a leitura ou mesmo quando a terminamos. Apesar dos temas profundos e preocupantes, não deixa de conter uma certa dose de sentido de humor, de comentários mordazes e irónicos. No entanto, se os meus argumentos não são suficientes, aconselho-te a ver o vídeo incrível da Tatiana Feltrin e mergulhares nos seus comentários motivadores. Já leste este clássico de Virginia Woolf? O que achas de Mrs. Dalloway? Qual a tua personagem favorita? Conta-me tudo nos comentários e vamos conversar sobre esta obra incrível!