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terça-feira, 27 de julho de 2021

#Livros - Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa

 

#Livros - Grande Serão: Veredas, de João Guimarães Rosa

Sinopse

Publicado originalmente em 1956, Grande Serão: Veredas, de João Guimarães Rosa, revolucionou o cânone brasileiro e segue despertando o interesse de renovadas gerações de leitores. Ao atribuir ao serão mineiro sua dimensão universal, a obra é um mergulho profundo na alma humana, capaz de retratar o amor, o sofrimento, a força, a violência e a alegria. 


Opinião 

Quero começar por dizer que este foi o livro mais difícil que li em toda a minha vida. É escrito com um registo muito ligado à oralidade e complica ainda mais porque estamos a falar de uma oralidade de português do Brasil, totalmente mergulhada na região de Minas Gerais e arredores. Um truque muito útil é tentar ler em voz alta mas, mesmo assim, confesso que foi complicado entrar no estilo e agarrar um bom ritmo de leitura. Depois de ter desistido na primeira tentativa, optei por ler poucas páginas de cada vez e foi esse o segredo para ter terminado esta leitura exigente. 


Mas não penses que a dificuldade está na falta de interesse pelo enredo, bem pelo contrário. É precisamente porque a história é fascinante que dei por mim a obrigar-me a esforçar-me para ler mais páginas que tinha previsto inicialmente. Riobaldo conta-nos a sua história na primeira pessoa a um ouvinte misterioso que não participa activamente mas que percebemos a sua presença e as perguntas que coloca através do rumo que o nosso narrador dá em determinados momentos da narrativa. 


Podes ler ainda a minha opinião sobre O Monte dos Vendavais


O protagonista é um fazendeiro já idoso que nos relata os seus anos de jagunço pelos sertões. No entanto, também nos conta da sua infância e juventude e todo o caminho que percorre até se tornar verdadeiramente um jagunço. A linha do tempo, que está longe de ser consecutiva, é outro factor que, por vezes, dificulta a leitura e pode nos fazer perder durante o relato. Os saltos temporais entre várias fases do seu passado servem para contextualizar e apresentar algumas das personagens que mais influenciaram as suas decisões. 


"E veja: eu vinha tanto tempo me relutando, contra o querer gostar de Diadorim mais do que, a claro, de um amigo se pertence gostar; e, agora aquela hora, eu não apurava vergonha de se me entender um ciúme amargoso."


Os vários chefes com quem se cruza e para quem trabalha são fundamentais para a sua formação e para o seu crescimento, mas Diadorim é o ponto central da sua viagem pelo passado. Os seus caminhos cruzaram-se desde a infância e ao reencontrarem-se no meio dos jagunços que percorrem o serão o carinho de outros tempos dá lugar a um amor platónico que envergonha Riobaldo e que este tenta reprimir a todo o custo. Por vergonha, por medo que o julguem menos homem e, no fundo, por achar que não é certo esse amor. 


Podes ler também a minha opinião sobre Romeu e Julieta


O outro grande protagonista deste romance é o próprio Diabo, que é citado de uma forma quase obsessiva e recorrente, utilizando os nomes mais inesperados e invulgares que se lhe conhece. A dada altura Riobaldo sente-se tentado a fazer um pacto com o Diabo o que o conduz a uma espiral de loucura onde não sabe se realmente concretizou esse desejo. Assim, ao mesmo tempo que nos conta esse episódio ambíguo, vai afirmando que o Diabo não existe. 


"O senhor avista meus cabelos brancos... Viver - não é? - é muito perigoso. Porque ainda não se sabe. Porque aprender-a-viver é que é o viver, mesmo. O sertão me produz, depois me engoliu, depois me cuspiu do quente da boca..."


Este é um livro fascinante, complexo e cheio de camadas. Passei grande parte do livro com a certeza que sabia qual seria o desfecho apenas para confirmar isso mesmo mas com uma reviravolta final com a qual não contei nem consegui prever de forma alguma e que me deixou perplexa e me fez compreender melhor porque estamos perante uma obra-prima da Literatura de língua portuguesa.  


Podes ter medo deste tipo de livro, mas acredita que o esforço que ele exige é totalmente recompensado ao longo da leitura. Quando terminei, só queria recomeçar e procurar as pistas que não vi, se é que elas existem. Este é um livro que precisa mesmo de ser lido e não o posso recomendar mais. De qualquer modo, se precisas de mais incentivos para pegar neste livro, podes ver ainda o vídeo da Tatiana Feltrin ou do Literatura Fundamental. Aceitas o desafio? 


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Wook | Bertrand

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