Sinopse
D. Catarina recusava-se a ir. A raiva a toldar-lhe os pensamentos.
Era ela a legítima pretendente ao trono de Portugal. Filha de D. Duarte, casada com o duque de Bragança, neta de D. Manuel I.
Não, não iria às Cortes de Tomar assistir ao juramento.
Ao contrário da maioria da nobreza portuguesa, nunca aceitaria que o rei de Espanha se tornasse Filipe I de Portugal. Continuaria a lutar até ao fim pela independência da coroa que era sua, nem que para isso tivesse de sacrificar tudo e todos.
Filipe tentou que D. Sebastião desistisse da ideia de lutar contra os mouros em Alcácer Quibir. Mas o destino estava traçado. Morto o rei de Portugal, era preciso pensar no futuro. Filho de D. Isabel e do imperador Carlos V, neto mais velho de D. Manuel I, entraria triunfante com os exércitos em Portugal, o país da sua adorada mãe, e reclamaria o que era seu por direito. Nem mesmo o fascínio que nutria pela sua prima Catarina o iria desviar do seu objetivo.
Isabel Stilwell, autora de romances históricos mais lida em Portugal, traz-nos uma história empolgante repleta de conspirações e intrigas, acerca de um período fundamental e conturbado da nossa História.
Narrado a duas vozes, ficamos a conhecer Catarina, uma mulher fascinante e corajosa, esquecida pela História, e Filipe I, um rei apaixonado por arquitetura e botânica, atormentado por episódios obscuros que deram origem a uma lenda negra que ficaria para sempre associada ao seu reinado.
Opinião
Filipe I de Portugal, escrito por Isabel Stilwell, a melhor autora de romance histórico em Portugal, é uma obra que mergulha na vida e no reinado do monarca que uniu as coroas de Portugal e de Espanha no século XVI. A autora é sobejamente conhecida pelas suas narrativas envolventes que trazem à luz episódios marcantes da História nacional. Com um estilo acessível e cativante, Stilwell combina pesquisa rigorosa com uma prosa fluída, permitindo ao leitor compreender com facilidade o contexto histórico e ainda sentir a humanidade dos personagens históricos que povoam as suas páginas. Neste livro, ela apresenta-nos um Filipe multifacetado, explorando a sua trajetória política, as suas relações pessoais e o impacto das suas decisões no destino de Portugal.
O livro insere-se num contexto histórico marcado por profundas transformações políticas e sociais no final do século XVI e início do século XVII. No meio da crise da dinastia de Avis, a crescente ascensão de Filipe II de Espanha ao trono português, que culminou com a sua aclamação em 1580, trouxe à tona tensões entre as duas nações ibéricas. Este período foi caracterizado pela luta pela independência, uma vez que muitos portugueses, embora não todos, viam o domínio espanhol como uma ameaça à identidade nacional e à autonomia política do reino. A obra explora a trajetória deste rei envolto em escândalos e mistérios, mas também coloca ao seu lado, a competir pelo protagonismo, a sua prima, Catarina de Bragança, cujo direito ao trono concorre contra o seu, direito esse de que nunca abdicou, mesmo quando percebeu que não tinha ao seu lado as armas para lutar por ele devidamente.
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Isabel Stilwell começa por narrar o final do reinado de D. Sebastião, retratando esta figura duma forma que permite compreender os mitos e lendas criados à sua volta desde o nascimento, os anos onde a coroa foi assumida pelo Cardeal D. Henrique, o último filho de D. Manuel I, e a crise dinástica que se seguiu à sua morte, dado que não teve a coragem de escolher um herdeiro entre os netos do seu pai. Assim, a autora aborda eventos cruciais, como a resistência portuguesa, liderada pelo Prior do Crato, o neto bastardo de D. Manuel I; as tensões entre os nobres que restaram e que pareciam comprados pelos interesses espanhóis; e os conflitos com os inimigos externos. Na verdade um dos aspectos mais fascinantes deste novo livro da autora é a galeria de personagens ricas e diversas, que moldam a narrativa histórica e emocional da época.
"E quem te apoiará quando eu já cá não estiver? Pensa, sobrinha minha, és mulher. Uma mulher capaz, inteligente, firme, vejo bem como geres a Casa de Bragança e reconheço a tua marca em todas as decisões, mas és mulher! E haverá muita gente a opor-se a que uma mulher use a coroa."
O protagonista, Filipe I de Portugal, é retratado como um monarca complexo, cuja ambição e desejo de unificação dos reinos ibéricos, a concretização do sonho do avô, o levam a enfrentar desafios políticos e pessoais. Apesar de vermos a face obscura reconhecida nos livros de História que lemos na escola, também encontramos uma figura mais humana, devoto da mãe, revoltado com o peso da herança do pai, incluindo as desconfianças de tudo e de todos, um pai carinhoso e próximo, sobretudo das filhas mais velhas. Do lado oposto, destaca.se a infanta D. Catarina de Bragança, sua prima e rival pelo direito ao trono português. A relação entre Filipe e Catarina é marcada por intrigas e conflitos, mas também por uma enorme atração, que nunca se sobrepõe ao papel político que defendem. Fica muito evidente nestas páginas o papel das mulheres na política da época, embora sejam retratadas mulheres que procuraram romper as convenções e alcançar um lugar de destaque por direito próprio.
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A autora transporta-nos para um período crucial da História ibérica com uma prosa cativante e rica em detalhes e figuras históricas menos conhecidas. A sua linguagem fluída e acessível permite que personagens e eventos ganhem vida, como se estivéssemos a testemunhar as intrigas e os dilemas da época. As descrições vívidas dos costumes, das ambições e das rivalidades contribuem para prender o leitor da primeira à última página, sempre preso pela sua narrativa, mesmo quando todos conhecemos o desfecho histórico dos acontecimentos. Muito presente é a política do período, apresentada como um jogo de alianças e intrigas, onde a diplomacia se entrelaça com a guerra, sobretudo quando pensamos na Espanha que possuía territórios extensos e distantes, com interesses muito diferentes e até opostos aos da metrópole. Considero curiosa a forma como é exposta a diferença entre os costumes portugueses e espanhóis, em aspectos que nunca me tinham ocorrido, desde as formalidades até ao código de vestuário da realeza, algo que nos permite melhor compreender os medos de quem achava que iria ser absorvido e esta herança cultural se perderia.
"Faço sempre questão de que não me confundam com o meu marido. O duque de Bragança é o duque de Bragança, mas eu sou alteza real, infanta de Portugal, e essa distinção, a bem da minha causa, tem de ficar clara."
Volta a ficar provado o talento de Isabel Stilwell, a sua habilidade para criar as melhores narrativas históricas escritas em português, que não ficam a dever nada aos anglófilos e afins. De um modo brilhante, a autora consegue humanizar Filipe I, apresentando muito mais do que as suas conquistas, explorando as suas falhas e dilemas pessoais. A obra é um belo passeio pelos desafios enfrentados antes e após a União Ibérica, enquanto nos revela um pouco da complexidade da identidade portuguesa e das figuras históricas que foram determinantes neste período histórico, culminando com uma maior consciência do legado deixado pelos reinados dos homens retratados. Pessoalmente, adorei descobrir mais sobre um período tão intrigante da monarquia portuguesa, descobrir personagens fantásticos e conhecer mais sobre figuras mitológicas da nossa História. Fica confirmado o meu desejo de ler todos os romances históricos que a autora escreveu e que, certamente, continuará a escrever nos próximos anos.
Assim, para os apaixonados por História e pela figura fascinante e controversa de Filipe I de Portugal esta é uma leitura imperdível e até indispensável. Para quem quer conhecer mais sobre a História portuguesa e entender melhor o contexto sociocultural do século XVI, encontra aqui uma escolha segura e que entrega bem mais do que se espera. Agora, quero muito saber a tua opinião! Já mergulhaste nesta leitura? Que aspecto mais te chamou a atenção? Qual o teu personagem favorito nesta narrativa? Gostas da forma como as mulheres ganham protagonismo histórico nestes romances? Conta-me tudo nos comentários!
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