Sinopse
"Quando Margarida chegou à Casa da Azenha teve aquela sensação, não desconhecida mas sempre inquietante, de já ter estado ali."
Margarida é uma jovem professora de Matemática. Um dia vai a Vila Real proferir uma palestra e fica hospedada num turismo de habitação, casa antiga muitíssimo bem conservada e onde, no seu quarto, está dependurado o retrato a óleo de um homem que se parece muito com Miguel, a sua recente paixão. Por um inexplicável mistério, na manhã seguinte Margarida acorda cem anos atrás, no seio da sua antiga família.
Sem perder consciência de quem é, ela odeia esta partida do tempo. Mas aos poucos vai-se adaptando. Conhece o homem do quadro e apaixona-se por ele. Quando ele morre num acidente, Margarida regressa ao presente.
Romance simultaneamente poético e fantástico, As Esquinas do Tempo é mais uma prova do indesmentível talento literário de Rosa Lobato de Faria.
Opinião
É a minha estreia com a romancista Rosa Lobato de Faria, que conhecia enquanto actriz e autora de alguns poemas que foram musicados com bastante sucesso. Já tinha ouvido falar muito bem do seu talento literário, mas nunca tinha pegado em nenhum livro seu nem tinha nenhum na estante. Infelizmente, muitos livros da autora estão esgotados nas livrarias online, só sendo possível encontrar entre os usados. É o caso deste, que já merecia uma reimpressão para voltar às estantes e todos poderem descobrir o grande talento desta autora portuguesa.
Parti para esta leitura sem saber bem o que esperar, por se tratar da minha descoberta desta autora, mas também pela sinopse com um tom meio fantástico, que me deixou muito intrigada. Afinal, uma jovem que viaja no tempo não é um assunto recorrente na literatura. Tinha até algumas reservas se o que iria ler seria credível e seria capaz de me prender sem se tornar numa anedota ou paródia. Descansa, que nenhum dos meus temores se confirmou. Muito pelo contrário. São pouco mais de duzentas páginas que nos prendem, não logo de início, mas cedo.
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Acompanhamos a protagonista, Margarida, na sua viagem a Vila Real em trabalho, e temos acesso aos seus pensamentos e desse modo conhecemos alguns aspectos da sua vida em Lisboa. A família, pilar importante da sua vida, ainda que seja uma mulher independente e que não gosta de dar contas a ninguém da sua vida, o seu eterno apaixonado, Pedro, colega de trabalho mas por quem está longe de se sentir apaixonada, e o novo amante, Miguel, um homem que a tem arrebatado e feito sentir coisas novas, ainda que seja casado. Ao chegar ao seu quarto, depara-se com um quadro pintado a óleo de um homem igual a Miguel o que a deixa inquieta, pela vivacidade da pintura, que parece querer falar-lhe.
"Outras interrogações a assolavam como, por exemplo, se as pessoas que consideramos geniais não serão apenas viajantes de tempos mais avançados que sabem aquilo que ainda não sabemos."
Depois duma noite agitada, acorda no mesmo quarto, mas cem anos antes. Vai-se apercebendo estupefacta, sem entender como pode ser possível tal coisa lhe ter acontecido. Curiosamente, o quadro que a tinha perturbado na noite anterior, não se encontra nesse quarto. A sua nova família não se apercebe de qualquer diferença e assume que esta Margarida é a mesma de todos os dias. Descobre que tem uma pai e uma mãe próprios do século XIX e duas irmãs mais novas, cada uma com a sua personalidade e que, aos poucos, começa a querer bem.
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Passada a surpresa e uma certa resignação, começa a sentir-se frustrada por se encontrar presa tão longe da sua realidade, sem os confortos proporcionados pelas novas tecnologias, e com algum medo de ficar ali para sempre. Até que chega um convidado que procura uma esposa e pretende escolher entre as três irmãs. É um homem de meia-idade, viúvo, com um cargo importante e que acaba por escolher a irmã mais nova, a mais doce e que parece ser mais provável de vir a ser uma dona de casa prendada e uma esposa obediente. Mas o que realmente vai mudar a vida de Margarida é o sobrinho do noivo, um homem lindo, charmoso, interessante e que é igual ao seu Miguel do século XXI, nome e tudo.
"Sentia remorsos das vezes em conta em que maldissera os horrores do século vinte e um, a crise económica, a violência, a pedofilia, a sida, esquecendo as vantagens incalculáveis da vida moderna."
Este romance modernizado pelos padrões da noiva, não impede Miguel de a pedir em casamento e tornar-se noivo oficial, com autorização do pai e tudo. É uma paixão arrebatadora, que quase a faz esquecer as saudades da sua vida moderna e da sua família. As viagens no tempo são uma grande protagonista deste livro, mas não é a única. As críticas sociais são uma constante e povoam toda a narrativa. Temas como a violência doméstica, classes sociais, o papel da mulher em diferentes épocas e o machismo sempre presente ao longo do tempo.
O livro é incrível e muito amarrado, sem pontas soltas, sem perguntas sem resposta. Talvez o aspecto menos explorado seja a viagem da Margarida do século XIX para o século XVIII e o que teria acontecido com a mulher que foi substituir. Compreendo, porque acompanhar essas viagens iria confundir, tornar o livro interminável e impossível de saber tudo o que teria acontecido a todas estas Margaridas do passado longínquo. Acho também que o final poderia ser mais explorado, ser mais claro e menos subentendido, mas não deixa de ser um fim espectacular. As portas do fantástico que Rosa Lobato de Faria abre são extraordinárias e obrigam o leitor a pensar nessa possibilidade como algo real, que nos poderia acontecer e em como reagiríamos.
Já conhecias este romance? E a autora, já conhecias alguma das suas obras? O pensas desta temática de viajar no tempo? Conta-me tudo nos comentários e vamos conversar sobre os livros de Rosa Lobato de Faria!
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